quarta-feira, 21 de março de 2012

Sobriedade Total

SOBRIEDADE TOTAL

Dr. Roberto Lucato
Advogado e Jornalista Limeira/São Paulo

Em termos de mídia, existem determinados assuntos de pouca repercussão e podemos dividi-los em dois segmentos: aqueles cujo potencial de abrangência é de fato reduzido e isto faz com que sejam menos comentados e outros curiosamente importantíssimos, porém, socialmente apresentam-se como reprováveis e assim, são jogados debaixo do tapete.
Necessariamente, os assuntos pertencentes a este segundo grupo relacionam-se com as mazelas socioeconômicas, muito discutidas em campanhas eleitorais, porém, de difícil solução, como observamos, porque não se transportam do papel à prática.
Uma destas questões é o alcoolismo e, na semana passada, passou sem maiores comentários o registro de 70 anos do A.A. mundial.
É verdade que Alcoólicos Anônimos não possui grandes credenciais em matéria de marketing, ao contrário, a Irmandade tem um sistema próprio de interagir socialmente e, obviamente constitui-se por anônimos, o que já coloca seus membros em uma interessante situação de igualdade.
De reconhecimento do problema comum, da incurabilidade da doença e finalmente, de uma disciplina que, alcançada, reconduz o alcoólico à convivência familiar e, por extensão, ao meio profissional em que, teoricamente, ele estava inserido. Mas não é devido a este conjunto de tradições que os alcoólicos desmereçam elogios e maior visibilidade entre a opinião pública.
O fato é que, há 70 anos, o sistema de recuperação do alcoólico é eficiente; o que falta, isto sim, é um tratamento mais direto da doença e, extensiva te, do problema.
Não perderia nosso precioso tempo inserindo neste comentário estatísticas recentes e antigas sobre os avanços do alcoolismo na sociedade, especialmente entre os jovens. Basta ligarmos o televisor e lá aparecerá, a todo instante, uma dessas mulheres descomunais associando prazer à bebida, como é vinculada a sensação prazerosa – mas sem propaganda oficial – às drogas ilícitas, e isto exerce uma enorme influência entre os que defino "seres em formação". O que não aparece na propaganda diz respeito à progressão do consumo, e isto me parece ser uma bomba de efeito retardado porque ninguém consome uma garrafa de aguardente ou uma caixa de cerveja na primeira vez que experimenta estas bebidas.
Para chegar lá o indivíduo vai se entregando, pouco a pouco, às peregrinações do inconsciente, de um cérebro a cada dia mais voltado à necessidade de reencontrar aquela sensação. Um cérebro, também destruído, incapaz de discernir entre sensatez e irracionalidade; falido no processo de monitorar atividades diárias, avaliando o certo e o errado, o nocivo e o saudável.
Por estas e outras entendo e valorizo o A.A. como são absolutamente importantes outras organizações anônimas como CVV e NA, pois o drama da bebida parece institucionalizado.
Até se inventa um nome adequado para aceitar o alcoólico: bebedor social! Mas tudo isso não passa de uma profunda hipocrisia. O álcool, mais do que nunca, está se incorporando em festas, travestido de estimulante. Portanto, se temos de conviver com ele, o melhor que temos a fazer é ficar atentos. Especialmente alertas na incorporação da bebida a determinados hábitos entre as gerações que se formam, tentando afastá-lo e, naquela em que os prejuízos já se encontram visíveis e mensuráveis, encaminhá-la ao A.A..
Não é fácil este segundo expediente, pois o convencimento desta condição é o ponto de partida. O início de um encaminhamento franco e amigo, destituindo uma situação inconscientemente suportável, mas, na prática, causadora de estragos de proporções imprevisíveis, da sala de estar ao trânsito.
Que as tradições ao A.A. sejam mantidas por mais 700 anos, auxiliando na recuperação dos alcoólicos, seus empregos e fundamentalmente, do seio familiar. E tudo isso feito de uma maneira aparentemente tão simples: evitando, só por hoje, o primeiro gole.

Vivência n° 97 - Set/Out. 2005

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