terça-feira, 13 de março de 2012

O Quinto Passo é uma celebração da vida

O Quinto Passo é uma celebração da vida

Precisamos nos sentir seguros em três áreas da vida: sexual, social e emocional.

Tem gente que diz que o problema do Quarto Passo é o Quinto Passo. A idéia de relatar a alguém aquilo que você pôs no papel inibiria o ato de escrever. Todavia, será que isso não funciona ao inverso também? Saber que alguém está ali, disposto a ajudar você nesse processo de limpar a casa, poderia servir de incentivo.

As pessoas brincam demais falando que começaram seu Quarto Passo, dizendo: “mas foi até aí que eu cheguei”.

Isso é uma grande pena, porque a recompensa de terminar o Passo é imensa. Não estou falando de um clarão vindo do nada, mas do início de um processo, o processo de simplesmente fazer amizade com a pessoa mais importante que você não conhece: você mesmo. É disso que de fato todo o resto do programa trata.

Olhar para você pela primeira vez pode ser assustador. Para mim foi o problema de confundir o Quinto Passo com o sacramento católico da confissão que conheci desde menino. Ficava deprimido cada vez que pensava em entrar naquela pequena caixa azul chamada confessionário. Havia vergonha e culpa grudadas nesse ritual, e não tinha conexão com a minha vida cotidiana. Eu havia pecado e devia receber absolvição.

Estando ainda acorrentado às lembranças do que para mim se havia tornado um ritual de ódio a mim mesmo, naturalmente evitei os Passos de “faxina de casa” por muito tempo (e os Doze Passos e as Doze Tradições ainda por cima mencionam os mesmos pecados). Talvez A.A. não fosse um programa religioso, mas com certeza me lembrava algumas práticas religiosas bastante deprimentes.

Hoje em dia, toda essa experiência contém um significado completamente novo para mim, positivo e levantador do moral. Dizem que a verdade machuca. Não é a verdade que machuca, é a negação. Depois de ser aceita, a verdade faz a gente se sentir muito bem. Um irmão religioso que realiza retiros para homens em A.A., na minha área, diz: “Tudo o que você precisa está bem na sua frente”. Que declaração poderosamente verdadeira e maravilhosa! Tudo o que preciso, mesmo as coisas que ainda não sei que não me servem, porque ainda estou pensando que gosto delas. Dá-se a elas o nome de defeitos de caráter. Gosto de chamá-las de esconderijos. São bebidas debaixo de um disfarce, objetivos de uma curta visão ou indignos. (As palavras são importantes. O jeito como converso comigo é o que decide como me sinto e como me comporto.)

Agora, enxergando instintos bem direcionados, e como meus desejos naturais tornam a mim e a outras pessoas infelizes, tudo faz sentido. Não quero continuar sendo infeliz. Então, quando hoje penso em “pecados”, penso na palavra “transgressões”, como está no Pai Nosso. Os pecados são transgressões. De início, não vi que a nossa literatura diz que preciso estar seguro em três áreas da minha vida: sexo, sociedade e minhas emoções.

Nunca li que tinha emoções retorcidas, dificuldades emocionais ou excessos de emoção negativa, nem que a imposição irracional dos meus instintos sobre outras pessoas era a causa de muita infelicidade para mim. O que eu pensava é que esses Passos eram a respeito de ser “bonzinho”. E são mesmo. Mas eu preciso começar por ser verdadeiro.

Olhando de novo para a maneira que confundi os Passos Quarto e Quinto com o sacramento católico da confissão, me recordo que a absolvição nunca me ajudou em nada, mas me colocava no que chamavam de “estado de graça”, que era uma coisa que eu imaginava me qualificasse para posar para quadros sagrados. Nos Passos Quarto e Quinto não estou procurando absolvição, mas sim aceitação procuro uma chance de olhar outro alcoólico olho no olho, uma chance de fazer uma conexão humana que estenderá uma ponte sobre o vazio dentro de mim, e para lá onde a culpa me fez ficar com medo de olhar.

Em A.A. fala-se muito sobre graça, mas o pessoal raramente diz o que é isso. Para mim é tempo e espaço numa atmosfera segura, onde eu possa olhar para o meu comportamento passado e lidar com ele sem medo. E quando falo de “comportamento” não me refiro apenas a “atos pecaminosos”. O comportamento inclui percepções, pressuposições, sentimentos, ilusões e motivações, bem como ações. A graça me concede o espaço vital de que necessito, onde não me sinto julgado nem tenho confirmada a minha experiência anterior de mim mesmo.

Para mim, o problema real com os Passos Quarto e Quinto não era “o que vai ser se eu for julgado?”, mas sim “o que vai ser se não for julgado?”. É que não saberia como reagir a uma imagem de mim que já não tivesse desenvolvido na minha imaginação distorcida.

Para todos e todas que tomam esses Passos comigo, eu falo: “Aceito você, mesmo antes de saber quem você é. Na atmosfera da graça, fico contente esperando descobrir. Sei que a minha humanidade vai sair enriquecida nesse processo. E quando acabar, ambos estaremos mais prontos para nos desapegarmos das coisas que fizemos, e que fizeram mal a nós e aos outros”. Os Passos Quarto e Quinto significam a celebração da vida em todas as suas maravilhosas possibilidades, através do contato com as nossas próprias experiências e as dos outros. São mais um Passo em direção ao tema de todos os Passos: a alegria de viver.

( Jim N. Grapevine)

VIVÊNCIA N.°75 JAN/FEV 2002

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