sábado, 28 de maio de 2011

D. Laurence Freeman, monge beneditino.


D. Laurence Freeman, monge beneditino.
Conheceu o A.A. há três anos.

Texto colocado no Tablet de dezembro.
Há alguma coisa, eu penso, que todos nós buscamos, ainda que não possamos discernir ou conhecer. Chamamos de empatia, que não é o melhor termo na medida em que sugere que estamos procurando pessoas para entrar em empatia conosco, enquanto que, pelo contrário, ela é sobretudo mútua, uma aceitação espontânea de igualdade e de destino comum. Uma espécie de cair de amor sem o desejo de possuir ou até mesmo de passar ao estágio de enfatuação idealizada. Eu não sei o termo exato – o fácil “simpático” pode ser, ou até mesmo a não traduzível “saudade”.
Em última análise, o objeto de busca é Deus, o Deus vivo. Não a divindade fria da moralidade e das estruturas de poder. Mas a luz no fim do túnel que nós sabemos que nunca nos rejeitará ou mesmo pronunciará um julgamento que não seja a revelação de uma verdade compassiva. É o Deus do abraço imediato e infinito. O fim da ânsia por amor. O Pai, como Jesus o entendeu. Mas Ele é encontrado também neste mundo e se manifesta nas relações raras que são construídas na perfeita humildade enquanto não há nem poder nem competição. Para nos ajudar a entender “humildade”, a “Nuvem do Desconhecido” distingue entre humildade imperfeita - na qual a piedade religiosa se especializa – uma auto-dramatizaçao de todas as faltas importantes do nosso ego – e a perfeita humildade na qual nós simplesmente nos conhecemos, em Deus, com todas as nossas faltas auto-evidentes, exatamente como Deus nos conhece. Nesta humildade-que- é-sabedoria, nós somos soprados para diante ao perceber, às vezes por dolorosas e lentas gradações, que somos, sem dúvida, dignos de sermos amados. Isso leva tempo e não é fácil conseguir, como pode parecer.
Ela pareceu, se você me desculpa pela caricatura, uma senhora idosa comum. Ela não mantinha contato visual prolongado e esperou até o fim da reunião para falar: isso pode, às vezes, denotar um enorme ego, esperando pela última palavra ou um ego fraco aproveitando a última oportunidade para ser ouvido. No caso dela, a julgar pelo tom e estabilidade, foi a decisão de um ego equilibrado, um pouco auto-respeitoso, envergonhado, mas não mais discreto. Há uma espécie rara de autoridade que emerge, como deve ter ocorrido com Jesus, enfurecendo os seus opositores. Emerge sem esforço de uma personalidade que tem tanto a conhecida humilhação quanto experiência de um estado de ressurreição vívido. Ela relatou a sua história. Como, há muitos anos antes, havia bebido por longo tempo e estava simplesmente criando cinco filhos. Um dia, difícil de admitir, ela estava dirigindo a esmo pela cidade quando percebeu que procurava uma igreja, qualquer igreja. Ela não era pessoa religiosa. Quando encontrou uma, tocou a campainha e um sacerdote abriu a porta. Até hoje ela não se lembra do que disse quando descarregou a sua penúria e vergonha sobre ele. Tudo de que se lembra, na medida em que ele mudou a sua vida, foi que ela se sentiu aceita e conhecida. Talvez ele fosse o melhor dos sacerdotes ou o pior. Naquele momento, na espiral abaixo do seu desespero, ele foi apenas um sacerdote para ela.
É muito apaziguador ver como aquela experiência de encontrar aceitação e reconhecimento era tão redentora; Ela, a experiência, mudou a sua vida e permaneceu viva no seu íntimo, décadas depois, como um momento de Graça que santos podem aspirar e nunca receber, como diretamente ela recebeu. Ainda mais, com a frescura que daquele momento permaneceu nela e com Julian de Norwich, ela garimpou aquele momento de revelação por toda a sua vida para encontrar novos depósitos de significação, mas ela não estava vivendo no passado. Havia conhecido outras alegrias e rupturas, como a descoberta da meditação como a chave do décimo-primeiro passo, que a encheu de gratidão. Em realidade, ela parecia estar intoxicada – o que Gregório de Nyssa chamou de intoxicação sóbria.
Estando agradecida e sabendo-se aceita, desfrutou de um estado de consciência imensamente libertador. Ansiedades e inseguranças que mantiveram você amarrado por eras desertam imediatamente na medida em que você ascende a novas alturas do self e descobre como as alegrias de dar excedem as de receber – e porque você não viu verdade tão óbvia como esta antes?
Como outros que praticam o programa de 12 passos, ela nunca esqueceu que é como bater na base da rocha e subir de novo com a ajuda daquele discernimento totalmente imprevisto e da incomensurável energia que chamamos de Graça. Pareceu a ela, como para muitos que têm a sua própria história para contar, que o tempo encurtou. O passado foi redimido e o futuro, ainda desconhecido, estava assegurado. Ela estava viva dentro do espírito do Advento –, o instante lento que chega do futuro para nós e a sua erupção no presente. E tudo porque, numa tarde comum, alguém abriu a porta para um estranho e ter sido para esse alguém o que Deus é para nós e o que devemos ser para cada outro.

Tradução:
Dr. Laís Marques
Rio de Janeiro/RJ

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